DAVID FONSECA, “FUTURO EU” – A CARTA

Caríssimos, o meu nome é David Fonseca e sou músico.

Faço também muitas outras coisas, algumas pequenas e insignificantes, como desviar os pés das formigas que constroem um universo desconhecido subterrâneo a 4 metros da minha porta de casa, e outras maiores e fulcrais, mas que acabam por ocupar o mesmo espaço das pequenas. E hoje, no anúncio público do meu novo trabalho discográfico, resolvi ser eu a escrever o press-release que geralmente acompanha estes eventos, habitualmente cheios de adjectivos sonantes e informação genérica carregada de datas e factos mais e menos relevantes. Não que tenha algo contra press-releases e outros mecanismos de promoção anónima, mas este é um momento especial para mim e prefiro falar-vos dele de forma mais pessoal. Vou tentar ser breve, sei bem como o tempo nos escapa a todos. A minha boca encostada ao vosso ouvido, a hesitar entre palavras, como explicar o que me atravessa o coração há tanto tempo?

Há um ano e meio entrei numa casa vazia a poucos metros do mar, o Inverno a empurrar o vento contra as janelas, a familiaridade de uma casa onde curei desilusões e alimentei sonhos, quase todos impossíveis como os sonhos devem ser. Um computador, uma máquina de escrever, um microfone, um teclado e uma guitarra foram montados no meio da sala e, desligado do mundo lá fora, deixei o meu mundo interior tomar conta daquele local, a minha voz a bater nas paredes, fita-cola a prender as teclas num acorde só, cordas que partiam com a agitação e ânsia do momento. O caos de ideias e sons de muitas horas deu lugar a um longo e solene silêncio, de onde abruptamente emergiu a minha voz a cantar estas palavras:
“Não vás
Não deixes um momento só levar
A luz do teu lugar”
Foi assim que, sem o ter decidido conscientemente, o meu primeiro disco inteiramente cantado em língua portuguesa começou a acontecer. Algures no meu mundo interior, encontrei-me de frente com esse sítio que tão poucas vezes explorei na minha vida. O que me levou até esse sítio é uma história mais longa e dura, pouco dada à brevidade do formato de um press-release, fica para outro sítio, outro dia.
Olho para esta página em branco e tento imaginar uma forma de descrever este disco sem recorrer aos lugares comuns habituais como “o disco mais pessoal de sempre” ou a insuportável “pedrada no charco”, mas não me ocorre nada que possa exaltar de forma precisa o meu entusiamo com este conjunto de canções. Nunca um trabalho musical esteve tão perto da minha forma desajeitada, inconstante, revoltada, inquieta e sedenta de viver os dias, as horas, os segundos, as pessoas, os sítios, as mãos que me agarram, o amor, sempre o amor. Não sei descrever música, duvido que alguém o saiba verdadeiramente, mas a intensidade com que toda esta aventura foi vivida traz à tona esses lugares abstractos e infinitos que fogem à normalização dos dias, à uniformização dos sons e ideias que atravessam o nosso espectro sonoro em melodias de fundo no centro comercial, ao encontro suave ou violento com as emoções que não encontro noutro lugar senão na música. Talvez seja um disco emocionalmente político, a contar a minha história também na esperança de encontrar os meus pares de aventura do outro lado da linha. Corro para a frente, é o único sítio que tenho para correr na esperança de te encontrar. E vou parar por aqui, há quanto tempo estamos aqui deitados?
Onde, como, porquê, quem:
“Futuro eu” chega às lojas no dia 16 de Outubro e está em pré-venda a partir de hoje no iTunes e Fnac a um preço especial até à data de lançamento.