O LADO NEGRO DA POP
“Bloodsport”, dos Sneaker Pimps
O terceiro álbum dos Sneakers Pimps apresenta uma banda com um evidente controlo da electrónica, gerando um curioso cruzamento de sonoridades e ambientes. O título é “Bloodsport” e o balanço é positivo.
Uma das bandas mais subestimadas do panorama musical actual, os Sneaker Pimps têm percorrido um interessante percurso desde os últimos anos da década de 90, combinando influências para gerar um universo – não só sonoro mas também visual – específico e peculiar.
“Becoming X”, o disco de estreia, trouxe-lhes um relativo sucesso devido aos singles “6 Underground” e “Spin Spin Sugar”, onde a cativante voz de Kelli Ali era acompanhada por envolventes atmosferas trip-hop. Em “Splinter”, o segundo registo de originais, Chris Corner ocupou o cargo de vocalista e o resultado foi um álbum ainda mais intenso e estimulante, ainda que a recepção da crítica e do público tenha sido pouco consensual.
Com “Bloodsport”, de 2002, o grupo destaca-se, mais do que nunca, como um projecto de culto, longe das aproximações ao mainstream que marcaram os seus primeiros passos. Cruzando referências abrangentes, o espectro sonoro do terceiro álbum dos Sneaker Pimps mescla ambientes trip-hop, rock, industriais, pop, electro e góticos, gerando uma sedutora aura de tensão e mistério que vicia a cada audição.
A banda sempre criou canções que, apesar de relativamente acessíveis e por vezes bastante “catchy”, são mais do que inócuos pedaços de música para enfeitar playlists. Carregadas de densidade e mistério q.b., as composições de “Bloodsport” não são excepção, exibindo um forte apelo dançável a par de um conteúdo lírico menos imediato, mas suficientemente intrigante.
O single “Sick” é um exemplo de elegância e sofisticação pop, recorrendo a uma utilização eficaz dos samples e proporcionando um refrão apelativo. Momentos como o enérgico “Kiro TV”, o denso “The Fuel”, ou o inebriante “Think Harder” congregam entusiasmantes cargas de sombra e inquietação, com expoente máximo no fenomenal “Loretta Young Skills”, uma das melhores canções da discografia dos Sneaker Pimps.
Tão determinante como o absorvente recurso à electrónica é a prestação vocal de Chris Corner (pontualmente bizarra e andrógina, à semelhança do aspecto do músico), essencial para que as canções consigam ser invulgarmente enigmáticas e penetrantes.
Comprova-se, então, que o cantor foi uma óptima escolha para substituir Kelli Ali, que desistiu do grupo após o primeiro álbum para se dedicar a uma carreira a solo.
Os detractores poderão acusar “Bloodsport” de ser um disco demasiado derivativo, dados os visíveis paralelismos com nomes como os Massive Attack, Nine Inch Nails, Portishead, Depeche Mode, Placebo ou Tricky.
Embora não estejam à altura de algumas dessa referências, os Sneaker Pimps geram, ainda assim, uma pop negra com consideráveis marcas de personalidade, não obstante as potenciais influências.
O resultado é um álbum quase sempre interessante (apesar de alguns momentos mais convencionais, como “Blue Movie”) e ocasionalmente brilhante, que ainda está a tempo de ser (re)descoberto.
Autor: Gonçalo Sá